O cliente mais usual do quiosque é super-rápido e costumo designá-lo por PPV - Pede, Paga e Vai embora. É assíduo, vem sempre à mesma hora e geralmente traz dinheiro trocado. É impossível impingir o que quer que seja a um PPV. Quando estamos a sacar um exemplar da 37ª colecção do 24 Horas , já o PPV se pôs a milhas. Se tem mais de um metro e oitenta, o PPV corre sérios riscos de cabecear violentamente a estrutura metálica do toldo. Faz de conta que não se passou nada, desaparece e volta no dia seguinte, pronto a repetir a dose.
Depois temos o cliente PPF – Pede, Paga e Fica. É o meu preferido, principalmente nas horas mortas da manhã. Não tem pressa, gosta de apreciar o que está exposto à sua volta e se não tem cuidado acaba por gastar mais do que aquilo que estava à espera. De facto, os PPF são um bom alvo para as que eu chamo de segundas escolhas. Não, não estou a falar do Mantorras, mas sim da possibilidade de ao cliente PPF ser sugerida uma determinada publicação suplementar que poderá ir de encontro às suas preferências. Enquanto comentam as últimas asneiras do governo, geralmente apanham com um “...por falar nisso, hoje saiu a Maxmen”. As 20 centímetros dos seus olhos, a foto da capa faz milagres. Se a coisa teve sucesso, convém não abusar em mais sugestões, ou corre-se o risco de o cliente se transformar num PPV.
Estes são os dois tipos de cliente principais. Depois temos os sub-clientes, em muito menor número mas com as suas particularidades muito especiais.
Há o cliente PF, dos Pedidos Difíceis. Invariavelmente do sexo feminino, coloca questões sobre revistas de ponto de cruz, de croché, arraoilosou bordados, certamente na esperança de ouvir uma pormenorizada descrição sobre o conteúdo da última edição da Para Ti, publicação referência das bancas. Um “não estou muito bem dentro desse tema” torna-se imperativo neste casos bicudos, e à cliente PF são abertas as portas da secção de revistas.
O cliente PE – Pedidos Estranhos – é raro, mas tem garantido um lugar de destaque nas Memórias do Quiosque. “Por acaso não tem calçadeiras?” ou “Vende milho para dar aos pombos?” ficarão para sempre marcados nos momentos mais hilariantes. Ouvir isto sem desmanchar uma gargalhada terá sido das mais árduas tarefas que ultrapassei no quiosque.
Finalmente há o CES – Cliente Espantalho do Sporting. Dizem que há pelo menos um em cada quiosque e eu confirmo. Aparece à 2ª feira, sempre que o fim-de-semana desportivo lhe corre de feição, e tem preferência pela hora de ponta, quando as probabilidades de dar de caras com benfiquistas são mais favoráveis. A 30 metros do quiosque já se ouve a cantoria “Ninguém pára o Benfica...”. Chegado ao local, pede os 3 desportivos, pergunta sarcasticamente pelos resultados e, no meio das bocas ao cabelo do Nuno Gomes ou aos mergulhos do Simão, consegue fazer dispersar qualquer Pede, Paga e Fica que se encontre por perto. Colecciona o Lucky Luke, o Michel Vaillant e há tempos saiu-se com esta: “Começa-me a guardar aquela colecção da Anita. Mas não digas a ninguém...” E eu não disse...
Um abraço, G."
Para ler em Diário de um quiosque.